Juliano Domingues
Jornalista e Cientista Político
Professor de Comunicação & Política da Universidade Católica de Pernambuco
juliano@unicap.br
A pesquisa Ibope sobre a sucessão em Pernambuco divulgada semana passada chamou atenção pela diferença entre os primeiros candidatos ao governo do Estado.
Pelos dados apresentados, Armando Monteiro (PTB) lidera a disputa com 43%. Paulo Câmara (PSB) aparece em segundo, com 8%. Jair Pedro (PSTU) e José Gomes Neto (PSOL) somam 2% cada um.
A lisura da pesquisa é alvo de questionamentos na Justiça Eleitoral por parte do PSB. Entretanto, vamos partir do pressuposto de que os dados são fiéis à realidade – já que o TRE ainda não se pronunciou a respeito.
O objetivo aqui é tentar interpretá-los a partir da seguinte pergunta: o que explicaria esses números, em termos de estratégia de comunicação dos candidatos?
Tendência à manutenção
Pesquisas recentes têm procurado identificar a presença maior ou menor de sentimentos de mudança ou de continuidade no eleitor. A questão, porém, não é tão simples assim, dicotômica, entre escolher “isto” ou “aquilo”.
Os números sugerem que boa parte do eleitorado parece querer mudança, mas, ao mesmo tempo, continuidade – um sentimento contraditório apenas à primeira vista. Para o eleitor, pode até haver mudança, desde que não se perca o que foi conquistado até agora. Em poucas palavras, neste momento, a continuidade deve falar mais alto.
Os números relativos ao sentimento de manutenção não são nem um pouco desprezíveis.
Em pesquisa divulgada em novembro do ano passado, o Ibope mensurou o “Grau de mudança desejado para o governo” em nível nacional. Os dados mostraram que 38% dos entrevistados desejam “muita mudança, alguma continuidade”; 23% anseiam por “pouca mudança/mais continuidade”; e 12%, por “total continuidade”.
Pode-se afirmar, portanto, que 38% desejam alguma continuidade e 35% desejam pouca mudança ou total continuidade. Ou seja, 73% dos entrevistados desejam, em algum grau, continuidade.
Outra pesquisa, também do Ibope, divulgada mês passado, aponta que 35% dos entrevistados defendem a manutenção de alguns programas por parte do governo federal. Para outros 21%, o próximo governo deve fazer poucas mudanças e dar continuidade a muita coisa. Já 9% anseiam por total continuidade.
O desafio maior daqueles que pretendem se eleger é elaborar um discurso de aderência entre sua candidatura e esse sentimento.
E o que esses números nos dizem?
Essas pesquisas foram realizadas para se medir a percepção do eleitor em relação à presidência da República. Entretanto, elas refletem o sentimento do brasileiro de um modo geral, o que a torna útil para se analisar, também, cenários estaduais.
Se o que se verifica entre os eleitores é um forte sentimento de continuidade do que vem dando certo, a disputa parece ser a seguinte: quem representa mais essa continuidade? Imagina-se que o candidato que melhor expressar esse sentimento, melhor colocado estará nas pesquisas.
Sob essa perspectiva, não é de se espantar que os dois candidatos que sugerem mudanças expressivas (Jair Pedro, do PSTU, e José Gomes, do PSOL) estejam entre os últimos na disputa. Ao mesmo tempo, os dois primeiros representariam, em tese, a manutenção daquilo que o eleitor entende que conquistou e, por isso, estariam à frente dos demais candidatos. É o que parece ocorrer neste momento.
Mas qual o motivo da distância tão grande entre os dois primeiros? O que justificaria a ampla vantagem de Armando Monteiro e os apenas 8% de Paulo Câmara?
A hipótese aqui levantada diz respeito, justamente, ao sentimento do eleitor em relação ao plano estadual e ao cenário nacional.
Vamos, portanto, especular…
Como sua chapa é composta pelo PT, o senador Armando Monteiro se coloca como o legítimo candidato de Dilma e de Lula, aos quais, imagina-se, o eleitor associa suas conquistas econômicas e sociais recentes.
Além disso, o candidato do PTB se sente à vontade para fazer referência a eventuais conquistas do governo estadual durante a gestão de Eduardo Campos (PSB). E faz isso também com certa legitimidade, uma vez que seu partido integrou a base do ex-governador.
Nesse sentido, o candidato do PTB está numa situação confortável: os benefícios de se associar à continuidade vêm dos dois lados, tanto do plano da política nacional quanto da estadual. E o candidato pode assumir essa postura sem maior constrangimento.
A princípio, não há dúvidas de que o candidato Paulo Câmara (PSB) também representa continuidade. Porém, não se pode perder de vista um aspecto importante: o eleitor tem se mostrado conservador.
Se o eleitor tende à continuidade, por que imaginar que entre um candidato conhecido e um quase – ou totalmente – desconhecido ele optaria pela segunda alternativa?
Outro elemento que parece relevante: esse mesmo candidato quase – ou totalmente – desconhecido possui como principal cabo eleitoral um candidato à presidência que tem feito oposição ao governo Dilma e, por tabela, ao presidente Lula (embora discretamente).
Na prática, o eleitor pode estar visualizando as seguintes opções:
(i) um candidato que, por meio da sua estratégia de comunicação (sobretudo nas inserções de TV e rádio), mostra-se vinculado tanto às conquistas nacionais quanto às estaduais e, por isso, parece defender uma gestão de pouca mudança, mais continuidade, e que é apoiado pela atual presidente da República, Dilma Rousseff, e pelo ex-presidente Lula;
ou
(ii) um candidato fruto do governo que trouxe benefícios ao eleitor no plano estadual, mas que integra um grupo que parece defender mais mudança e pouca continuidade no plano federal – quando comparado ao seu adversário do PTB –, e que é oposição à atual presidente da República, Dilma Rousseff, a qual é apoiada pelo ex-presidente Lula.
O que parece estar em jogo é a percepção do eleitor sobre o que representa uma maior ou menor continuidade daquilo que foi conquistado. A depender da estratégia de comunicação dos candidatos, essa percepção pode se consolidar ou se reverter.
Reverter percepções não é algo simples. Além disso, como o eleitor tende à manutenção, o mais provável é que esse cenário se consolide. A disputa, porém, está só começando. E ainda há 44% do eleitorado dando sopa. Trabalho para as equipes de campanha é o que não falta.
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