Política é, em última instância, a disputa pela percepção e essa batalha é travada essencialmente no campo da comunicação. As mais recentes pesquisas Ibope (29 de outubro) e Datafolha (06 de novembro) ajudam a conferir contornos menos abstratos a essa premissa, sobretudo quando dois fatos em especial são observados.
O primeiro é o crescimento do percentual de intenção de votos da candidata do PT, não apenas no levantamento Datafolha, em que Marília Arraes passa de 18% para 21%, mas sobretudo nos dados do Ibope, com crescimento acima da margem de erro, de 14% a 18%. Múltiplos fatores costumam influenciar processos dessa natureza, sobretudo aqueles referentes a estratégias de comunicação.
No caso específico, variável interveniente relativa à comunicação de identidade política parece ter sido decisiva: em um ambiente marcado pela polarização nacional, a candidata reforçou seu vínculo com a cor vermelha, a estrela do PT e com o ex-presidente Lula. Crenças e valores implícitos nesses símbolos incentivaram o engajamento de parcela do eleitorado que, ao se sentir acolhida, correspondeu favoravelmente em números.
O segundo fato, por sua vez, diz respeito a uma correspondência negativa. O índice de rejeição da candidata do Podemos na pesquisa Ibope passou de 14% para 20% e no levantamento Datafolha, de 15% para 35%. Evidências indicam que quanto mais conhecido um candidato, maior a chance de ele ser rejeitado, afinal só se rejeita aquilo que se conhece. Entretanto, apesar de usual, essa parece ser uma variável menos relevante nesse caso específico.
A hipótese mais plausível diz respeito a uma associação entre propaganda negativa e incremento de rejeição, uma vez que a candidata tem sido alvo preferencial dos seus adversários, principalmente do candidato do DEM, Mendonça Filho, com o qual disputa parcela semelhante do eleitorado. A fonte dessa estratégia comunicacional são mensagens postadas no passado pela própria delegada nas suas redes sociais, o que torna a desconstrução da sua imagem mais convincente.
Em ambos os casos, a estratégia discursiva tem feito a diferença, embora por caminhos distintos, e pode se mostrar decisiva numa campanha de tiro curto e intensamente midiatizada como esta. Os fatos e números destacados aqui sugerem uma lição para além das eleições: o passado não é imprevisível.
Juliano Domingues, doutor em Ciência Política, é professor e pesquisador de mídia e política da Unicap.
Texto publicado no Jornal do Commercio do dia 08 de novembro de 2020.
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