Juliano Domingues
Maurício Costa Romão
A política tem razões que a própria razão econômica desconhece. Não levar isso em conta induz análises apressadas a equívocos relativamente comuns, como o de estabelecer relação causal entre o auxílio emergencial da covid 19 e a melhora da avaliação da gestão Jair Bolsonaro.
Pesquisa Datafolha do início deste mês apontou o melhor índice de aprovação do atual presidente desde o início do mandato: 37% dos eleitores classificaram sua administração como positiva. Os números mais favoráveis ao governo surgem em um contexto de pagamento de R$ 254,6 bilhões em auxílio emergencial, com quase 1/3 da população beneficiada.
A cronologia dos eventos pode induzir o observador a uma percepção de causa e efeito entre o auxílio financeiro e a melhora de avaliação positiva. Isso se deve, em grande medida, a uma lógica explicativa predominante na economia e na política baseada no chamado pressuposto da racionalidade. Com efeito, o indivíduo recebe o auxílio, associa o fato ao governo federal e, consequentemente, passa a avaliá-lo positivamente. Certo? Não. Errado. Ao menos em parte.
Uma investigação mais aprofundada das últimas pesquisas Datafolha (junho e agosto) sugere algum reparo em análises assentadas unicamente no auxílio emergencial como variável relevante. Observe-se que em todos os segmentos socioeconômicos e demográficos pesquisados o presidente melhorou sua avaliação. Além disso, a aprovação aumenta e a reprovação diminui também nos estratos de maior renda, entre assalariados registrados, funcionários públicos e empresários, segmentos que, por definição, não se habilitam ao auxílio emergencial.
A essa realidade, portanto, não aplicaria aquela frase-chavão do estrategista de Bill Clinton. Ao invés de “é a economia, estúpido!”, James Carville bem que poderia dizer “não é a economia, estúpido!” – ao menos não exclusivamente. Caberia muito mais outra frase-chavão, dessa vez a do jornalista H. L. Mencken, segundo o qual “para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada”.
O auxílio impacta, sim, a avaliação do governo. Entretanto, é preciso ponderar seu peso diante das evidências ao se considerarem outras variáveis intervenientes, inclusive as não necessariamente racionais, mas ligadas ao pantanoso terreno das emoções e das paixões. Ou seja, o problema é mais complexo do que pode parecer.
Juliano Domingues é cientista político e Maurício Costa Romão é economista
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