Juliano Domingues
Jornalista e Cientista Político
Professor de Comunicação & Política da Unicap
juliano@unicap.br

 

Imagine um jogo de tabuleiro, cujas peças não são movidas por acaso. Cada ação é pensada a partir das suas consequências para o cenário atual e para a próxima jogada do adversário. Esses movimentos, juntos, compõem a estratégia dos participantes, definida em função de um objetivo final.

Pode chamar esse jogo de Política.

O início oficial da campanha em Pernambuco ofereceu a oportunidade de se visualizar um exemplo prático desse jogo. No centro da disputa, estão as regras da propaganda eleitoral e o uso do espaço público.

Mais do que aspectos legais, o debate entre os candidatos Armando Monteiro (PTB) e Paulo Câmara expõe comportamentos moldados pelas circunstâncias, com possíveis consequências eleitorais e políticas para a imagem de ambos.

 

Momento 1

Quando se iniciou o período previsto legalmente para se fazer propaganda eleitoral (6 de julho), o esperado ocorreu: as ruas do Recife foram, gradativamente, tomadas por cavaletes, bandeiras e carros de som.

Como também era de se esperar, percebeu-se uma predominância da cor amarela. Em franca desvantagem em pesquisas divulgadas até o momento pela imprensa (Ver, por exemplo, pesquisa Ibope), o candidato Paulo Câmara não tinha tempo a perder.

Era hora, portanto, de movimentar no tabuleiro a peça da propaganda. Afinal de contas, até aliados mais próprios de Câmara, como o prefeito do Recife e coordenador de campanha, Geraldo Júlio (PSB), já haviam reconhecido publicamente o desafio de tornar o candidato do PSB conhecido do eleitor (Ver matéria).

Como de costume em campanhas eleitorais, procurou-se superar essa barreira por meio da distribuição de material de propaganda pelos principais corredores de veículos e de pedestres da capital. Se o desafio é grande, a visibilidade deve ser maior ainda, principalmente quando se tem dinheiro em caixa.

Entretanto, nessas eleições, mais do que nas anteriores, um elemento chamado redes sociais digitais deve desempenhar papel fundamental. Foi por meio, sobretudo, do Facebook que eleitores manifestaram sua insatisfação quanto ao que seria um excesso de propaganda nas ruas das cidades (Ver matéria).

Era o momento para o adversário mexer suas peças. E ele estava atento.

 

Momento 2

Referindo-se àquilo chamado, genericamente, de “voz das ruas”, o candidato Armando Monteiro (PTB) apresentou uma proposta: um pacto a ser firmado entre os candidatos pela não poluição da cidade durante a campanha (Ver matéria).

A proposta recebeu até nome: “Pacto por uma Campanha Limpa”.

Na prática, o acordo significaria a restrição do uso do espaço público para divulgação de candidatos, com limitações à circulação de carros de som e à distribuição de cavaletes e bandeiras.

No tabuleiro da disputa política e eleitoral, uma jogada e tanto.

É possível inferir, sem maior dificuldade, que as circunstâncias permitiram ao candidato do PTB fazer tal proposta. Basta se perguntar: seu comportamento seria o mesmo caso ele não tivesse em torno de 35% de vantagem em relação ao seu adversário? Provavelmente, não.

Que o diga o próprio Geraldo Júlio (PSB), simpático a iniciativas desse tipo quando era líder nas pesquisas à Prefeitura do Recife em 2012 (Ver vídeo). Agora, em desvantagem, é crítico ferrenho ao pacto. Evidência de que, em campanha eleitoral, a seletividade é irmã das circunstâncias.

 

Dilema

Provavelmente, se o eleitor for consultado sobre mais ou menos propaganda nas ruas, a imensa maioria defenderá menos propaganda. Nesse sentido, a estratégia do PTB de assumir o discurso por uma campanha que polua menos a cidade parece eficiente do ponto de vista eleitoral e político.

Como Armando possui ampla vantagem em relação ao segundo candidato, encontra-se em situação confortável para propor isso. Ao mesmo tempo, o candidato do PTB procura passar ao eleitor uma imagem simpática, de alguém que se preocupa de fato com o espaço público, a ponto de fazer certos sacrifícios para que ele seja respeitado, como recolher sua própria propaganda.

Já a campanha de Paulo Câmara enfrenta uma situação delicada: como ser contra a ampla propaganda, dentro da legalidade, quando se tornar conhecido do eleitor é uma necessidade urgente? Ao propor um pacto pela não poluição, Armando apresenta um dilema para Paulo Câmara.

 

Como o candidato do PSB deve se posicionar?

Por motivos óbvios, não faz sentido Câmara aderir ao pacto proposto por Monteiro. Seu desafio, além de se tornar conhecido, inclui, também, reverter a versão de que, mesmo dentro da legalidade, uma campanha suja a cidade.

O candidato do PSB tem movimentado suas peças. Publicamente, afirma que a proposta é, na verdade, uma tentativa de cercear, informalmente, sua liberdade de se apresentar como candidato (Ver matéria).

Cabe ao eleitor, diante das versões, fazer sua análise.

Porém, caso se propague o discurso “ambientalmente correto”, digamos assim, de não poluição, o excesso de propaganda pode se transformar em contrapropaganda, com a consequência de possível prejuízo eleitoral.

Não há como prever os desdobramentos e a repercussão desse debate, por exemplo, nas redes sociais, onde ele acabou ganhando dimensão. Cabe ao candidato do PSB se movimentar de modo a anular a possibilidade de prejuízo junto ao eleitor. Ao PTB, resta procurar antecipar esse movimento.

Esse é o jogo que apenas começou a ser jogado.