Juliano Domingues

Aline Grego

Uma marca reflete crenças e valores. O governo Michel Temer apresentou a sua: o slogan “Ordem e Progresso” sobre um fundo azul estrelado, numa alusão à bandeira nacional. O que isso significa?.

Em política, as mensagens costumam estar carregadas de simbolismo. A foice e o martelo ou a suástica são exemplos de símbolos que se propõem a sintetizar e simplificar algo complexo. Espera-se que o receptor interprete a mensagem e passe a aderi à ideia nela propagada. Trava-se, assim, o que Castells chamou de “batalha pela construção de significado na mente das pessoas”.

A marca Temer ilustra essa tentativa, a começar pela frase “Ordem e Progresso”. Nesses dois elementos está a base do Positivismo, pensamento do século XIX que pressupõe ideais de cientificismo, moral e evolução civilizatória. O lema prevê, ainda, uma relação de causa e efeito: a ordem técnico-científica e a conciliação política levariam ao progresso e ao desenvolvimento.

A influência positivista estampou na bandeira do Brasil os dizeres que, agora, foram estrategicamente resgatados. Nessa batalha pelo significado, nada surge por acaso. A adoção desses elementos sugere uma fusão simbólica entre governo e pátria. O presidente carente de apoio popular apela à emoção subjetiva de um povo.

As cores azul e amarela também estão presentes. Ao lado do verde, ambas estiveram nas ruas nos últimos anos como símbolo de atos contra o governo Dilma. Pode-se inferir que a marca do governo Temer sinaliza uma associação direta com movimentos pró-impeachment. Caso contrário, teria feito opção por uma cor neutra. Isso contradiz o ideal de reconciliação simbolizado pela faixa central a abraçar o globo estrelado.

Do ponto de vista administrativo, entretanto, a marca sugere cooperação. Como cada estrela representa um estado, os governadores estariam contemplados no novo governo. Reunidos sobre a superfície de uma esfera, todos estariam juntos em um mesmo lado, assentados em um Brasil de letras maiúsculas escritas com a cor da paz.

A imediata divulgação de uma identidade visual do governo interino indica que o presidente entrou no jogo para ganhar. Ao mesmo tempo, reflete certa esquizofrenia: distinguir-se de uma administração da qual é vice, apresentando-se como “novo governo”.

Juliano Domingues é doutor em Ciência Política e Aline Grego é doutora em Semiótica. Ambos são professores da Unicap.

Texto publicado no Jornal do Commercio no dia 15 de maio de 2016