A disputa política nunca mais foi a mesma depois da TV estabelecer como regra a dinâmica da imagem em movimento e a prevalência da forma sobre o conteúdo. Ao completar 70 anos em meio a uma eleição, a pergunta é: será que ela ainda faz diferença? A resposta é sim, sobretudo porque vivemos o tempo das televisualidades.
Para se ter uma ideia, basta dizer que o brasileiro gosta mais de TV do que de geladeira. O aparelho de televisão está em 97,1% das residências, normalmente na área nobre, na sala, enquanto o refrigerador é encontrado em 96% das casas, lá na cozinha, segundo pesquisa da Eletrobrás. Mais do que um eletrodoméstico, a TV aberta é a principal fonte de informação e de entretenimento da população brasileira, com destaque para o período da pandemia, quando as emissoras viram aumentar sua audiência e confiabilidade.
Esse reinado parecia prestes a ruir com a popularização do acesso à internet e de smartphones. No entanto, o desenvolvimento de tecnologias digitais da comunicação e os novos hábitos de consumo de mídia a elas atrelados encontraram no vídeo sua mola propulsora e conferiram outro status à TV. Mais do que um eletrodoméstico, uma plataforma ou um meio de comunicação, ela tem se fortalecido enquanto linguagem audiovisual em mutação, com capacidade camaleônica de se adaptar a telas dos tipos mais distintos.
Ao longo de seus 70 anos, a TV consolidou uma cultura do conteúdo em vídeo, a ponto de pesquisa Kantar/Ibope indicar que 99% das pessoas no Brasil assistem, de alguma maneira, a esse formato, seja pela rede aberta, por assinatura, aplicativos de mensagens ou sob demanda. Isso indica a transição da TV linear para a TV conectada, conforme aponta pesquisa sobre Uso de Tecnologias de Informação e Comunicação nos Domicílios Brasileiros (TIC Domicílios): cresce o número de lares com acesso à internet ao mesmo tempo em que aumenta o uso da TV para acessar a rede mundial de computadores.
A tradição da imagem em movimento continuará a influenciar estratégias comunicacionais na política, mas sob outras dinâmicas – é o que se chama de televisualidade. Exemplo disso são os vídeos de candidatos com sátiras e paródias compartilhados em grupos de WhatsApp nos últimos dias. São novas formas de experiência audiovisual dando origem àquilo que pode se tornar o novo “tempo de tevê” e, portanto, fazer a diferença.
Juliano Domingues é professor e pesquisador da Universidade Católica de Pernambuco.
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